Sinto frio, muito frio. Puxo as
cobertas e me enrolo mais. Não resolve muito, porque falta algo. Algo que me
envolveria num abraço quente, quase febril. Algo que me tiraria as cobertas e
me cobriria com pernas, braços e um tronco grande. Apesar de não estar ali
fisicamente seu cheiro está em todo o lugar. Acho que é alguém lá no céu que
está me torturando. Abro os olhos, ainda pesados e doloridos de uma noite mal
dormida. São 8h30min, ele diria que é muito cedo para fazer qualquer coisa. Era
realmente muito cedo para bancar a garota forte, sorrir e seguir de cabeça erguida.
Faço uma varredura no quarto escuro para lembrar da situação que o havia
deixado na noite passada. O gato comia o resto de pizza que estava em cima da
escrivaninha, haviam copos de vinho espalhados por cada canto, banco, mesa ou
prateleira. A garrafa estava no chão junto com meu cobertor de casal e umas
roupas.
Já fazia uma semana. Uma semana
sem aquela voz suave no meu ouvido a cada passo que eu dava pela casa, ou
quando estava quase dormindo. Uma semana sem os beijos de bom dia e os sorrisos
ao esperar a avaliação sobre o almoço estilo Masterchef. Uma maldita semana
sem nenhum dedilhar no violão ou sentindo os dedos ligeiros fazendo voltas em
cada cacho do meu cabelo espesso. Sem contar nas suas incríveis habilidades de
fazer rir das coisas mais banais. Do fato de ele saber mais línguas das quais
eu sonharei em aprender. Tudo isso não deixou nada mais fácil quando ele disse que
seria melhor para nós dois, “conhecer pessoas novas é bom, sei que você vai
conseguir, logo nem se lembrará de mim” foi o que ele disse. Sabe, ele estava
longe de ser perfeito, mas era o meu pedaço imperfeito do paraíso e eu não
queria que acabasse assim. Nem assim nem de qualquer outro jeito.
Depois de me perder em devaneios
durante 15min decido levantar, tropeço na pilha de roupas. Junto-as e vou em
direção ao banheiro. Minha cara está um caos. Nariz vermelho, lábios mordidos,
olhos num tom marrom-azulado e inchados. Lavo meu rosto umas duas vezes com
água gelada. Não resolve muito, mas decido deixar assim. Tomo um café olhando
para a janela, à luz da rua era clara demais, então me encolho um pouco no
sofá. O que me lembra de que não fazia muito tempo desde a ultima vez que ele
estivera aqui e era torturante. Seu cheiro estava em todos os cantos do meu
pequeno apartamento bagunçado. No sofá. No banheiro. Nas roupas de cama e nos
meus pijamas. Até nos panos de prato da cozinha. Respiro fundo “acho que um
banho vai me fazer melhor”, penso.
É quando esbarro na jarrinha de
metal que ele me deu, eu coloquei flores artificiais porque não consigo cuidar
de coisas que necessitam de muita atenção. Lembro quando deixei meus cactos
morrerem, um secou e o outro acabou apodrecendo no mesmo vasinho, sendo que
normalmente eles são fáceis de cuidar. Não sei como ainda estou viva, com
tantos desastres. Então paro e lembro:
– Era ele que me fazia permanecer
viva. Era ele que cuidava de mim. Digo num sussurro.
Peça por peça minhas roupas caem
no chão. A banheira antiga já está cheia. Me sento com cuidado. A banheira se
tornou muito espaçosa sem suas pernas grandes e as coxas grossas. “Por quê você
me deixou, hein Felipe?”. As lágrimas escorrem sem esforço algum. Então eu
mergulho. Vejo tudo turvo. Não há mais lágrimas. Apenas a lembrança de como nós
éramos.
O primeiro encontro num café bonitinho
no centro da cidade. O segundo encontro no ônibus, quando eu meio sem jeito
sentei longe com medo de parecer desesperada para vê-lo novamente. Ele saiu do
seu lugar e foi sentar comigo. Nós nos beijamos depois. A nossa primeira vez.
Não sei quem estava mais nervoso e bancando o autoconfiante. Quando ele me
apresentou para os pais. Quando eu o levei na casa dos meus. E finalmente no dia
que decidimos que ele moraria aqui. Foi tão natural: “Eu vou te emprestar umas
panelas”, “Posso deixar umas roupas aqui?”, “Alô? Oi Jô, acho que deixei minha escova
de dente aí, pode conferir pra mim?” e então vieram os livros, os calçados, e o
resto do quarto que era necessário. E um belo dia ele percebe que era jovem
demais para “tudo isso”. Que precisava viver. Precisava do espaço dele. Da vida
dele. Da solidão.
Eu disse: “ok”, mas no fundo eu
queria dizer o quão idiota ele era e como conseguia ser egoísta ao ponto de só
pensar no seu próprio umbigo! Acho que era isso que ele queria. Mas, eu, tola,
não sou do tipo que faz o que as pessoas esperam de mim.
O ar está indo embora dos meus
pulmões. Será que o gato vai saber se virar e achar uma casa quentinha, com
comida e amor de sobra? Minhas contas vão acumular embaixo da porta? E quando
meu celular não tiver mais bateria e ninguém mais conseguir falar comigo e se
der conta de que a minha vida foi embora?
Então ele toca. Aquela música
irritante. Eu levanto. Meus pulmões ardem por ficar tanto tempo sem ar. Olho a
tela que estava acesa em cima do balcão da pia. Era ele.
– Oi... Felipe.
– Jô, oi, é... quer tomar um café?
Um grande segundo se passa. – Alô?
– Oi. É... hmm. Não sei. Eu... Eu
não esperava por isso, então, não sei.
– Tá, eu posso esperar, mas, não
demora muito. Não quero que o café esfrie e as flores murchem. Havia um sorriso
na sua voz.
– O quê?
– Só abre a porta Jô! Oxe! Cê
tirou a chave reserva que estava embaixo do tapete da entrada. Eu pisco várias
vezes até entender o que estava acontecendo, mas meu cérebro se recusa a
cooperar depois de tanto tempo sem oxigênio.
– É que eu tô no banho. Me dá uns
minutos. Me apresso pra pegar uma toalha e sair da banheira.
– Tá. É a resposta que eu ouço de
longe. Corro ainda molhada, com o cabelo pingando, de pés descalços e enrolada
na toalha. Abro a porta e lá está ele. Naquela camiseta preta que ele adora e
que eu também. Com o cabelo desgrenhado pela ansiedade e os dedos nervosos. Ele
tem flores de verdade nas mãos e uma térmica de café.
– Vim saber se você estava bem.
Ele olha ao redor. Acho que a casa sente a minha falta, tem uma calcinha na
mesa Jô!
Eu ri. Ele entrou, ainda meio
tímido. Eu sabia o que o silêncio mascarado não queria dizer. Ele também sentiu
saudade.
Este post faz parte do Desafio Imagem & Palavra do Interative-se! Eu recebi a imagem 7, que está no início do post e me serviu de inspiração. Queria agradecer ao meu namorado também que foi usado de modelo e porque ele vai pra praia ficar 20 dias longe(isso me deixou meio jururu e eu resolvi escrever um pouco sobre).
Ahhhhhh, fazia tempo que eu não lia uma coisinha assim que me deixa com o coração mole hauhua por que cê foi fazer isso comigo?
ResponderExcluirEu também quero receber uma térmica de caféééé hahuah
Ahh, já, já ele volta ): bom que depois vai dar pra mataaar a saudade!
Awn, não queria fazer isso contigo, eu juro!!! Hahhaha quem não quer né? Espero que ele volte antes até! Vou sentir falta do meu gordinho!
ExcluirAaaaah teu cabelo, esse corte adoro, é lindo. MEnina eu tava esperando um final diferente sabe, com aqueles finais meios dramáticos de superação, me surpreendeu que ele voltou. Fiquei tbm com o coração mole e feliz que ele voltou. Fica assim não, daqui a pouco seu namorado volto.
ResponderExcluirSe você quiser ler textos meus, pode clicar na aba Comportamento do Eu crio moda, ou ir para o Ser irreverente ^^
hahahah pois é, eu acho que peguei todo mundo de surpresa, minha amiga leu e disse que adorou o final, sucinto e fascinante!
Excluirbela história!
ResponderExcluirmami - http://mami.blogs.sapo.pt/
Obrigada, irei visitar seu blog!
ExcluirUaauuu!! Que história pura e fascinante. Adorei o final! ;)
ResponderExcluirFinais devem ser inesquecíveis, né!
ExcluirAi que gracinha um amor que história mais linda , vou confessar que achei que ele não ia voltar como todas as histórias mais voltou rsrs meu coração tava a mil kkkk vai surpreender todo mundo rsrs . Adorei
ResponderExcluirHAhahaha né, chaga de finais ruins, com morte e choro! Temos que acreditar no amor, que ele é possível!
ExcluirGente eu senti cada detalhe desse texto. E como já ouvi essas frases, "sou mto nova pra isso, n estou preparada, conhecer pessoas novas é bom, sei que você vai conseguir, logo nem se lembrará de mim." Só Deus sabe RS. Mto bom msm, adorei. Parabens
ResponderExcluirHAhaha obrigada. Bem, foi baseado em fatos reais.
ExcluirSenti cada pormenor do seu texto! Muito engraçado!
ResponderExcluirP.s. não consigo seguir o seu trabalho, algum problema?
Beijinhos e felicidades :) :*
Ué, que estranho! Tenta seguir por email!
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